Houve um tempo em que eu, estudante de comunicação social, absorto em artigos e livros que misturavam Bíblia com marketing e gestão de negócios, defendia que o líder cristão tem de ser um criador e articulador de visão. Praticar a liderança cristã, dizia eu, demanda formatar e comunicar uma visão com clareza, em exercício inicialmente solitário. Daí, motivar o núcleo de decisão, membros influenciadores e os crentes em geral a abraçar um propósito comum.
Entendo que igrejas são abençoadas quando se esforçam para implementar uma visão bíblica de ministério, mas não acredito que tal visão deva ser atribuída a um único indivíduo. O modelo de liderança do Novo Testamento não comporta a ideia de um suposto chefe visionário episcopal, funcionando como um CEO (Chief Executive Officer) eclesiástico. A igreja é corpo sacerdotal e o seu pastoreio é uma tarefa compartilhada. Diferentemente dos tempos do Antigo Testamento, na nova aliança Deus “é sobre todos, age por meio de todos e está em todos” (Ef 4.6). A figura do líder isolado da visão, que se sobressai ou é colocado sobre os outros, como canal exclusivo da iluminação e direção divinas, não existe em Atos ou nas epístolas.
Os colegas pastores concordarão que, enquanto caminhamos com a igreja, é tentador imaginar que podemos nos destacar sobre os demais, considerar o ministério como uma posição de poder e confundir autoridade espiritual com superioridade hierárquica. Somos inclinados a nos esquecer de que fomos chamados para a cruz, e que a igreja é o instrumento divino para nossa santificação e trabalho humilde. Na Escritura, um “ministro” é, literalmente, um servo que trabalha em favor de outros servos de Jesus Cristo.
A igreja é comunhão dos santos e nela eu sou abençoado pela graça ministrada por meus irmãos e irmãs. Os presbíteros regentes são coiguais (uma palavra preciosa, destilada da doutrina da Trindade) e os membros da igreja não são meus subordinados. Fui vocacionado para nutri-los com a Palavra e os sacramentos, enquanto sou por eles ajudado em vários aspectos de minha própria peregrinação cristã. Eu não sou um líder genial; parafraseando Eugene Peterson, como pastor eu apenas caminho com os crentes, buscando discernir o que Deus está realizando, o que ele nos orienta pela Escritura e como devemos responder a ele, aqui e agora. Nesse processo, eu e meus irmãos, presbíteros, assumimos alvos e trabalhos conjuntos em condução compartilhada, orientada por fé, ancorada na Bíblia e regada pela graça.
No mundo dos negócios, a liderança visionária confere dinamismo às organizações, forçadas a adaptar-se ao mercado globalizado. Na esfera religiosa, líderes visionários com viés episcopal erigem estruturas pujantes e conquistam seguidores engajados. O ponto a questionar é se esse modo de operação, bem como os resultados por ele produzidos, correspondem à igreja conforme o Novo Testamento.
Simpatizo com aqueles que, de boa vontade, assumem esse paradigma. Eu já estive nessas fileiras. Hoje a igreja onde eu sirvo a Deus busca simplesmente ser “uma família de discípulos de Jesus Cristo comprometida com a Bíblia”. Nada mais. Abandonei de vez a falácia da liderança visionária episcopal. Oro para que Deus me ajude a viver, até o fim, fiel ao modelo da liderança pastoral praticado pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo.